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sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

PRESENTE DE NATAL


“Deixei meu sapatinho na janela do quintal, papai Noel deixou meu presente de natal.”

Quem não se lembra da melodia natalina, tão cantada em nossa infância...

Pois é, ensinei meu neto a canção, e quis ele de toda maneira colocar o sapatinho no quintal, achei aquilo lindo, e muito positivo, quero que ele acredite no bom velhinho, que viva sua infância como ela deve ser vivida.

Pois é, acontece que na manhã seguinte o sapatinho não estava mais lá, e tenho certeza que não foi papai Noel que o levou, além de não ser o seu número, não creio que ele trocaria suas botas pretas de neve para usar um minúsculo calçado de criança, junto com os sapatinhos foram outros quesitos que se encontravam no quintal, alguns lençóis de cama, toalhas de banho, e um ferro de passar roupa.

Meu coração ficou apertado, teria que mentir para o menino, ou tiraria dele toda expectativa na espera da noite de Natal.

O difícil foi convencer que o velhinho havia levado seu sapatinho para a fábrica de brinquedos, e que seria dado de presente a uma outra criancinha que não tivesse nada para calçar.

O menino questionou-me perguntando, porque Papai Noel dava sapatos velhos para as crianças pobres, criança gostava de brinquedo e não de sapato, e que ele mesmo tinha deixado aquele no quintal porque machucava seu pezinho, e se pôs a chorar, não pela perda de um sapato que ele não queria mais usar, mas por saber que outra criança o ganharia de presente, e em sua cabecinha inocente a pobre criança além de não ganhar um brinquedo, também ficaria com os pés machucados.

Depois de muito florear a estória, acabei por convencê-lo, este saiu saltitante cantando a velha cantiga...

“Como é que Papai Noel, não se esquece de ninguém, seja rico ou, seja pobre o velhinho sempre vem.”

Naquele dia, muito do que havia do espírito natalino, que eu ainda tentava resguardar, foi pelo ralo, minha revolta não foi pelas coisas que me roubaram, mas por terem roubado o que ainda restava em mim de criança sonhadora.

Passei boa parte do dia pensativa, o que não estava realmente correto, era a maneira como eu aceitara o furto, com tanta simplicidade, como se fosse aquilo algo natural. Na ilusão de amenizar minha consciência, tentei me convencer de que aquele delito teria sido cometido por alguma pessoa que quisesse dar a alguém um presente de natal, e não poderia comprar.

Mas de nada adiantou, pois eu sei que naturalmente aquelas coisas seriam trocadas por uma criança sim, mas não por um brinquedo e sim por uma pedra de crack.

As lágrimas que não vieram com o choro de meu neto, agora rolavam silenciosas por minha face, uma tristeza abateu-me, ao perceber que a realidade esta distante demais de nossos sonhos de infância, que não podemos mais fazer as coisas simples que as cantigas natalinas nos ensinavam, e que crianças pobres neste país, não ganham presentes de natal por tirarem boas notas, pois a maioria deles esta nas ruas esmolando ao invés de se sentarem em bancos escolares, muitas destas crianças não possui sapato para deixar no quintal, aliás, a maioria se quer tem um quintal.

Vendo as campanhas solidárias de natal, fui ao correio de minha cidade escolher uma destas crianças para presentear, na ânsia de amenizar a culpa que sentia por todas elas, peguei uma cartinha simples, escrita em papel de embrulho, e que pedia com a maior simplicidade a Papai Noel, um emprego para seu Pai. Saio abatida por compreender que minha parte não é simplesmente fazer sorrir uma dessas crianças por apenas um dia, mas tentar ajudá-las a serem dignas.

Ano que vem, buscarei nas urnas um presente real a todas elas, fazendo com que outros despertem suas consciências política, e fazendo-os perceber, que cabe somente a nós cidadãos que tem um “quintal”, mudarem o pedido das cartinhas escritas ao nosso Bom Velhinho.

Feliz Natal.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

FOGO DE PALHA


Tenho pensado quantas vezes já ouvi isso... Fogo de palha...

Mas o que significa realmente, ser fogo de palha...

A palha queima com rapidez, isso eu sei... Porém mesmo depois de queimada, a palha mantém ao nosso redor o calor das brasas que já se apagaram, e deixam um aroma leve no ar, diferente das grandes chamas, que chegam e devastam, fazendo a maior fumaça, e impregnando tudo o que esta a sua volta com o cheiro de carne assada, pensando bem, ser fogo de palha não é assim tão ruim...

Tudo é uma questão de ótica.

Já tive alguns “incêndios” na vida, destes que te esquentam em demasia e depois são apagados com jatos do puro gelo da indiferença... Não me valeram de nada, mas em compensação, os pequeninos incêndios do tipo palha, deixaram em mim um calorzinho sereno que gosto até hoje de sentir.

Lembro-me mais destas pequenas e rápidas chamas, do que daquelas intrépidas e intensas que se apagaram do mesmo jeito, e ainda deixaram uma fuligem lascada para ser limpa.

Em determinados momentos da vida costumava fazer muitos planos, e nem todos foram passiveis de serem realizados, costumava então ser chamada assim, de fogo de palha, mas na verdade nem sempre o que planejamos na teoria funciona na prática, porque tudo vai depender de uma imensa série de fatores externos... Tudo tem a hora exata de ser e de acontecer, independente de nossa pressa ou de nossa ansiedade.

Há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu:
Tempo de nascer e tempo de morrer,

Tempo de plantar e tempo para colher o que se plantou...”(Eclesiastes:3)

Estive lendo minha lista de intenções para o ano que vem, na noite do dia 31 de dezembro, costumo pegar a antiga lista e conferi-la, faço isso há muito tempo, e já reparei que alguns itens da lista levam anos para serem cumpridos, então copio novamente os que não dei conta de realizar, para a nova lista, e assim passo mais um ano na tentativa de cumprir os objetivos que me impus, e sei que terei que fazer isso munida de muita paciência e amor, nada de impulsividade.

Quando falamos em amor, fico imaginando o que é amor fogo de palha...

Vou tentar ser mais prática... Quantas vezes esta semana você disse a alguém... Eu te amo? Ou ainda, quantas vezes você ouviu de alguém? Pode ter sido de qualquer um, filho, neto, marido, namorado, vizinho, amigo, você disse ou ouviu um eu te amo de algum deles???

Pois é, nem eu.

Mas lembro-me em certos momentos de ter dito a algum deles diversas vezes em um único dia, e depois, nunca mais. E não que eu fosse fogo de palha, apenas percebi que certas coisas não temos necessidade de repetir todo momento, e nem com ardores de paixão, basta a suavidade na atitude de demonstrá-lo.

Termino este texto com as celebres palavras de um poema de Camões...

“Amor é um fogo que arde sem se ver,

É ferida que dói, e não se sente;

É um contentamento descontente,

É dor que desatina sem doer...”

Então o fogo não tem que queimar, e sim aquecer.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

A PÉROLA


Recentemente lendo sobre curiosidades, deparei-me com uma reportagem que me deixou pensativa. Falava sobre pérolas, gemas valiosíssimas entre tantas outras pedras preciosas. Muitas lendas cercam as pérolas, os hebreus acreditavam ser elas, as lágrimas vertidas por Adão e Eva depois do crime do filho Caim. Já para os romanos, as pérolas seriam os choros das ninfas, que depois eram consagradas a Vênus por ter esta Deusa nascida no mar.

Os Orientais acreditavam ainda serem as pérolas o fruto do casamento da ostra com o orvalho.

Enfim, as lendas por serem sempre a parte lírica e romântica de algum fato, deixaram traduzidas e impressas a admiração por esta gema preciosa, e acreditava-se ainda, que ela protegia a inocência e era símbolo de pureza.

Mas meus pensamentos se voltaram para uma frase que dizia... “As pérolas são os frutos da dor.”

Quando um grão de areia penetra, as células do nácar começam a trabalhar e cobrem o grão de areia com camadas e mais camadas para proteger o corpo indefeso da ostra.

Fiquei por dias refletindo sobre as palavras lidas, e concluí ser uma verdade.

Se eu passar a vida me protegendo como uma simples ostra, se não me arriscar, se não tentar um novo desafio, se viver fechada e protegida, se for omissa serei apenas mais um molusco a povoar os mares, não terei nenhum valor, nada terei produzido.

A concha de uma ostra é feia e sem atrativos, mas em seu interior brilha do nácar que o reveste, pronto a produzir uma jóia rara.

Se eu quero deixar algum ensinamento precioso, ou fizer valer os meus dias de ostra, é necessário que eu abra a minha concha e permita que os grãos de areia nela penetrem, mesmo sabendo que neste processo sentirei muita dor, só assim produzirei uma pérola. Então terei feito alguma coisa que terá valido a pena, pois aquela gema valiosa não irá desaparecer comigo, se perpetuará como ensinamento.

Porém para que isso ocorra, é necessária grande coragem e boa vontade, de cobrir aqueles grãos com muitas camadas de amor, deixa-los ferir nossa alma, e depois lapida-los até que se transformem em algo realmente valioso.

Não há como negar que é necessário todo um processo para que haja um resultado.

Os grãos da areia branca e macia, que por vezes achamos inofensivos, entram em nossas vidas e tentam nos destruir, causando-nos muita dor, mas a sabedoria que adquirimos com o tempo, faz-nos reverter este mal em ensinamentos.

Quem de nós já não foi traído de alguma forma? Quem de nós já não se desiludiu? Quem de nós já não verteu lágrimas durante esta trajetória?

Lembre-se apenas de que uma ostra que não foi ferida, não produz pérolas. Pois uma pérola nada mais é, que uma ferida cicatrizada.